domingo, 25 de dezembro de 2011

Seita ao íntimo

Foi abrir a porta do sótão para o aroma tomar conta das minhas narinas, o perfume nas roupas finas e floridas. Era aquele cheiro que me matava lentamente até sentir a sensação maldita que eu odiava. Era o filme que passava na minha cabeça de todas as vezes que estivemos juntos. Eu odeio a sensação porque eu não tinha que sentir mais nada. Que sangue ainda me deixava rubro?
Abaixei-me tocando o chão com meus joelhos, era minha perda, tudo que me envergonhava, a falta de luta. Chorei.. Por amor, pela falta, pelo rosto dela na memória. Chorei por estar sentindo tudo de novo, pelo pecado que havia cometido anos atrás. Chorei pela minha falha tentativa de ser Deus.
Apertei o cetim nas mãos, amassando as roupas que sem querer serviram de lenço para lágrimas comuns. Como se fossem comuns, como na época em que eu era humano.
Eu tirei sua vida, não poderia trazê-la de volta, nem poderia ir ao seu encontro. Estou preso nessa minha vida para todo sempre e até para o sol me tornei invencível. Só de pensar que antes eu desejava isso, a eternidade. Mas isso não é uma boa escolha para quem não é aliado ao tédio, para quem vive em solidão.
A roupa amassada escapou entre meus dedos. Quando segurava aquele vestido azul celeste, sinto-a tão leve de como costumava ser. Faz-me bem imaginá-la naquele pedaço de roupa que fora rasgado acidentalmente no dia de sua morte. Faz bem para praticar minhas memórias e não deixá-la morrer. Ah como eu a amo e agora digo com vontade da alma, isso ninguém pode tirar de mim... Deuses, anjos, demônios, ladrões, cretinos, babacas. Nada mais importa ... Quando não consigo sossegar minha mente, esquecer e compreender. Lamentar já não posso mais, me desatino a chorar minhas lágrimas de crocodilo como tu mesmo me dizias.
Talvez seja mesmo tudo um teatro para esconder por momento o perverso que eu sou. Talvez você estivesse certa,sim crocodilo, amor, em mar de fogo e perdição. Mas eu te amei, com todo meu ódio eu te amei. Até dizer chega, até dizer nunca mais, até lhe enfiar a faca e desenhar as palavras que você ousou a desacreditar na minha cara . Me entenda, minha princesa jaz, a dor da sua perda eu carrego pra sempre.
Você nunca me entenderia e ainda não me entende, eu sei, porque sinto tua alma inquieta me rodear. Uma vez me disseram que conhecer a morte era compreender a vida. Teve de ser assim. Maldito é teu rosto que em sangue provei com cada parte do teu corpo. Maldito porque continuou me olhando, delirante. Ainda tem dúvidas de que isso é amor?
Então é assim que parto desta casa e queimo todas as suas roupas, substituindo por fumaça todo esse perfume. É assim que te deixo mais uma vez. Agora com meu próprio sangue escrevo no chão o que escrevi expelindo teu sangue no teu corpo aos gritos.
Je t'aime

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